terça-feira, 5 de abril de 2016

Me Ensina - Marcondes Mesqueu e Sara Bentes

...só disse uma coisa:

POR FAVOR, ME ENSINE A ANDAR COM VOCÊ



Marcondes Mesqueu

Sara é uma amiga cantora, poeta, professora de música, artista circence, menina de vida agitada normal/anormal como todas as meninas normais/anormais da sua idade, deficiente visual e monte de outras coisas. O amigo Google sabe melhor da sua vida do que eu. As vezes saímos pelas ruas do Rio conversando e resolvendo coisas. Gosto de papear com ela. Aprendo muito com a sua independência e determinação. Ela não é daquelas menininhas que gostam de ser pegas em casa. Se a zona de conforto se oferece ela aproveita, caso contrário quebra a pedreira até ver surgir à estrada.  Decide pelo mais prático. Quase sempre marcamos encontro na rua, saída de metrô, rodoviária... Certa feita íamos pela Rua do Lavradio, na Lapa, Rio de Janeiro. Eu, todo erradamente cuidadoso, e ela insistindo em segurar no meu braço para se sentir conduzida. De repente eu desvio de um demarcador de calçada. Esqueço da amiga. Sara esbarra no obstáculo de ferro. Acho que se machucou. Pergunto. Ela responde que não foi nada. Pede agora com firmeza para segurar no meu braço. Seguimos. Naquele momento entendi que Sara meio passo atrás de mim e segurando meu braço, todo movimento que eu fizesse com o meu corpo o corpo dela perceberia e com essa informação reagiria rapidamente. Quando vi Sara batendo de frente no obstáculo só disse uma coisa: Por favor, me ensina a andar com você.

Entendi que essa obrigação era dela. Abaixei a cabeça envergonhado.

O inevitável processo de evolução se dá através da troca de informação. O receber e oferecer um dado novo acontece naturalmente ao longo da história do homem. O escambo é um dos sangues que alimentam a vida. Podemos dizer que existem outros sangues como afetos, culturas, religiosidades,... e por ai vai, porém todos dependentes das trocas.

Vou me fixar no mais simples e óbvio fenômeno da existência humana que é a diferença entre cada um de nós. Gordos, magros, altos, baixos, ...e de repente surge a pedra no caminho da cultura que no passado apregoava o conceito de Normalidade para uns e Anormalidade para outros. Deficiente para uns e Eficiente para outros. E tudo estava resolvido. De um lado estavam os melhores e no extremo oposto os outros. Gênios sempre existiram, mas as sociedades evoluem regidas por conceitos e padrões que englobam a maioria. Regra é quantidade. Qualidades diferentes são exceções. O tempo passou. Evoluímos, contudo nem todos os cascalhos da velha construção social foram removidos.
Esse texto pretende ser uma troca com os meus amigos deficientes visuais. Eu que, apesar de ter um dolorido dedo de martelo escondido dentro da meia e sapato do pé direito, sou entendido como mais um normal. Meu osso “dedal” que entorta progressivamente gerando fisgadas não me impede de habitar essa confortável prateleira. Me reconheço com faltas de algumas informações para lidar com “os” e “as” Tiresias que passam pela minha vida. Se o Tiresias de Sófocles é aquele Sábio Cego que vê além da escuridão dos seus olhos eu sou aquele que busco entender como dar luz as formas que meus olhos registram. Como melhorar a minha comunicação com aqueles que são donos de uma luz que vai além da visão?

Vivemos na Sociedade do Espetáculo onde luz, cor e forma é uma trindade divinamente respeitada por uma maioria. A beleza física se constitui um culto escravagista na vida de muitas pessoas. Coitada das mulheres. Tem umas que se entregam a chibata da beleza. São negras que “inloirecem”, loiras que torram nas praias e salões para ganharem a forma da estrela do momento que é crioula. Assumir a moda é mais confortável do que ser singular. Em tempo: Uma grande legião de homens adubam seus corpos com medicamentos discutíveis e para alguns letais para terem musculatura de He Man. O sonho de ser belo e visivelmente aceito é a doença do mercado. O jeito de ver, agir e pensar nos apontam e chamam para os refletores. Os refletores insistem em ser seletivos, preconceituosos e “produtizar” seres humanos. E por ai segue a construção de valores que se autodestroem de tempos em tempos. A moda é o show.

É comum sermos convocados a declarar nossas preferências afetivas seguindo modelos de gordo, alto, baixo ou magro; ou então moreno, louro, mulato ou negro; com tatuagem ou sem tatuagem; careca ou cabeludo; alternativo ou sóbrio...
Beleza e sensualidade quando estão relacionadas à roupa representa jogo de cores, modelo, audácia...

Esses e outros detalhes da vida constroem conceitos, que constroem palavras, que constroem saberes com os quais nos relacionamos. Até quer ponto isso é ingrediente dos meus amores e desamores. Será que os caracóis revoltos dos cabelos da Sara contribuíram na quantidade de carinho e admiração que eu sinto pela sua caminhada? Me ajudem a entender os seus valores.

Entendo e pratico o jogo de olhares e caras. É bom e divertido. Por vezes me perco quando converso com minha amiguinha. Até onde me faço entender? O que tenho que aprender pra melhorar? Tenho que aumentar ou diminuir em cuidados. Quando ela diz “vou pra casa, preciso ficar só com os meus pensamentos” o que devo pensar. O que devo fazer com a minha deficiência que se assusta ao ouvir esse desejo e vê-lo se cumprir. Acho que nessa hora o cego sou eu. Me ensinem a não só ver como a enxergar. Sei como as imagens se formam na minha cabeça. Tenho vontade de saber como se forma na cabeça dela. O castelo do Rei, o cavalo do Príncipe e o nariz da Bruxa são formas pra mim. Não sei como se apresentam pra ela. Sou contador de histórias. Caras e bocas são texto na hora de interpretar no palco e na vida.

Gostaria de aprender mais sobre os valores estéticos saídos da escuridão e aprender a “melhor dizer” que “essa roupa a deixa mais sensual, menininha, senhora ou palhacinha” e isso se constituir numa discussão de ponto de vista onde o imaginário ganhe forma, cor e densidade. 

Até hoje ainda não dei uma rosa para minha amiga, mas se amanhã o fizer essa rosa precisará ter cor? E se tiver, qual será?
Em tempos de Sociedade do Espetáculo já vi até rosa azul. Pra mim isso é um desrespeito à flor e a natureza. Garanto que o Grande Arquiteto não aprovou. Gostaria que os meus amigos e amigas Tiresias me ensinassem a ver e perceber a partir do ponto de onde nasce a luz que é a escuridão.
 (dedicado a Sara Bentes, uma amiga
que a sua audácia me ofereceu)
    

Resposta:
Por Sara Bentes

Primeiramente: amigo, releia meu livro “quando botei a boca no mundo”. Ele esclarece muito sobre esta “visão na escuridão”.

Segundamente, nada do que vou falar aqui representa o segmento de pessoas com deficiência visual, parcial ou total. Tudo o que vou falar representa eu, Sara Bentes. Cada um tem sua forma de ver, e de não ver... Além disso, esclareço que aproveitei a oportunidade para falar a todos, e não só a você, querido amigo.

Sim, meu mundo tem cores, formas e estética. Flores pra mim nunca serão flores se não tiverem cores. Meu imaginário e meu inconsciente também fazem parte de um coletivo, de uma sociedade, de uma cultura. Não vivo num mundo à parte e óbvio. Sei o que simboliza a cor branca ou a cor vermelha numa rosa ofertada a alguém. Assim como compartilho da crença de que cada cor tem sua energia e seu efeito sobre nós. Pasme, há pouco tempo passei por tratamento de cromoterapia. Não preciso ver a cor, são meus pontos energéticos e meu corpo astral que recebem a cor. Sei o que significa um vestido preto, ou vermelho ou bege para uma mulher que sai à noite, por exemplo; me interesso por saber se o céu está azul limpinho ou cheio de nuvens brancas ou cinzas; depois de certo tempo de convivência com um novo amigo, quero sim saber que cor são seus olhos, seus cabelos e pele, e é libertador só saber sobre a aparência das pessoas depois de me aproximar delas por suas essências e outras características. Quando te conheço, não me faz mais a menor diferença que roupa você veste, que cara você tem ou o que diz sua aparência. Isso foi um aprendizado. Mas não significa que eu viva à parte das discussões e conceitos estéticos e visuais.

Quanto ao meu pensamento, ele se forma da mesma maneira que antes, quando eu enxergava: a partir de imagens. E você me diz: mas como você pode pensar nas pessoas e espaços que você só conheceu agora sem enxergar? E te respondo: pois é, há muito mais mistérios entre nossa orelha esquerda e direita do que supõe nossa vã filosofia. Minha mente simplesmente cria essas imagens para novos espaços e pessoas e coisas. Se te conheço hoje e automaticamente (porque é assim que funciona) meu cérebro te imagina cabeludo e um ano depois descubro que você na verdade é careca (como aconteceu recentemente com um amigo) levo um tempo pra reconfigurar você na minha mente imaginativa e te imaginar como realmente você é. Quando contei a este amigo que antes de saber que ele era careca eu o imaginava cheio de cabelo, ele disse que eu via era o sonho dele, que é ter muito cabelo, e me pediu que continuasse o imaginando cabeludo. Apesar de tentar, não consegui convencer minha mente a voltar atrás, mas algo muito estranho acontece: quando me lembro das primeiras situações com ele, quando ainda o imaginava cabeludo, as imagens da memória me trazem ele cabeludo...

Já as pessoas que conheço desde quando enxergava, mantenho na memória as imagens que vi. Essas pessoas na minha mente nunca envelhecem. É pedir muito da mente ficar alterando, redesenhando e reconfigurando essas imagens.

Nos meus sonhos à noite, como já contei em diferentes textos, normalmente enxergo, mas em alguns estou cega. Em outros estou enxergando, mas com a Izadora na mão, e penso: o que diabos estou fazendo com essa bengala? Mas gosto de sonhar enxergando, e me esforço para “abrir os olhos” nos sonhos em que estou cega. Tenho cada vez mais sonhos lúcidos, em que posso controlar parte ou todo o roteiro. E quando consigo, adoro procurar no cenário em que estou carros para dirigir, e me delicio com esta sensação. Quando quero muito saber como é fisicamente alguma pessoa próxima, peço para sonhar com ela. Acredito no desdobramento e na projeção de consciência, o que torna meu pedido totalmente possível. Por algumas vezes parece que fui atendida, mas nunca saberei se o que vi é realmente a verdade ou se foi criação inconsciente.

Sempre fui e continuo sendo uma pessoa bastante visual, não no sentido de ser guiada e dominada por minha visão, como é a maioria das pessoas, mas no sentido de imaginar fortemente dentro. Os desenhos que eu fazia quando enxergava eram todos criação minha. Todas as histórias que crio, contos e romances, primeiro imagino cada cena visual na mente, pra depois traduzir em palavras. Quando penso numa cena passada ou futura, primeiro imagino visualmente a cena, pra depois me ater a sentimentos e outras informações relacionadas a ela.

O mundo é visual; é sabido que praticamente 80% das informações que o ser humano assimila é a partir da visão. Uns mais outros menos. E outros ainda, como eu, não assimilamos nada pela visão. E isso não nos torna automaticamente mais evoluídos ou sábios que os que enxergam, e nem nos torna automaticamente com melhor audição, tato, olfato e paladar, e, indo mais longe, nem sexto sentido. Cada um é um e todos esses “mitos” de cegos com super audição, super tato, super olfato etc, explicam-se cientificamente. A sociedade vidente (que enxerga) tem tendências a romantizar, mitificar, criar fetiches, exagerar, subestimar, ignorar, rotular e “emprateleirar” os cegos. Tudo isso tem raízes históricas que se entrarmos no mérito da questão escreveremos aqui um ou mais livros. Mas só pra reforçar a ideia de que cada experiência é única, conheci um cego que não teve tato nem pra aprender o braile, conheço cegos que também são surdos, conheço cegos amargos e revoltados que vivem a verdadeira escuridão espiritual, conheço cegos que se sentem seguros tocando seu braço e outros que preferem tocar seu ombro ao caminhar, conheço cegos que preferem chorar e estar sozinhos com seus pensamentos e meditações, enquanto outros preferem chorar no colo de alguém e estar sempre rodeados de gente. Somos todos seres humanos, e se faço uma opção de ir pra casa e ficar sozinha, diferente da expectativa de meu amigo, isso não tem nada a ver com ser cega, e sim com ser humana e única.

Neste mundo visual, é claro que ficamos de fora de muito da comunicação mais imediata entre as pessoas: a comunicação visual, que engloba caras, bocas, olhares, gestos, posturas, movimentos e outros sinais. Com o tempo de convivência, nossos amigos videntes vão se adaptando a outras melhores formas de se comunicar com a gente. Não existe uma fórmula para ensinar isso, existe a singularidade humana, e cada um de nossos amigos videntes vai desenvolvendo suas diferentes e criativas soluções para transformar seus sinais visuais em novas falas, ou mudanças na voz, ou novas interjeições, ou sinais táteis dependendo da intimidade. Mas não subestime nossa inteligência, numa conversa entre amigos normalmente estamos entendendo tudo, e se, pela falta da visão, não entendermos vamos perguntar. Quanto à contação de história, a palhaçaria, a dança, o teatro e outras artes tradicionalmente visuais, faz parte de uma evolução coletiva o desafio de adaptarmos essas modalidades artísticas cada vez mais para todos, sejam cegos, surdos, cadeirantes etc. A arte, com suas infinitas possibilidades, sua flexibilidade e sua criatividade, já está pronta para incluir a todos, só nos falta manusear da melhor forma este grande instrumento.

Sobre ter mais ou menos cuidado, como guiar, como fazer isto e aquilo, além de bom senso, o que recomendo se resume numa palavrinha só: comunicação. “Se quiser me ajudar, pergunte primeiro se eu preciso, e se for me ajudar, entenda primeiro como..” como diz minha canção “Pra Quê”. Comunicação é tudo e, principalmente entre amigos, não tem que haver barreiras nela.

Por fim, não tem mistério, não tem magia, não tem encanto nem romantismo sobre tudo isso. Sobretudo, não tem escuridão. O não ver não é tudo preto, é simplesmente perceber de outros modos.

terça-feira, 22 de março de 2016

Acredito



Em particular me pediram pra explicar a letra da minha música “Acredito”, canção que fecha meu CD “Invisível”, e decidi responder publicamente e compartilhar com todos vocês as angústias e alegrias que motivaram essa canção. Embora eu pense que a interpretação da arte deve ser livre, sei que esta letra pode deixar incômodos, reticências e interrogações no ar, e merece explicações. Antes de mais nada, pra acompanharem a letra e a música, seguem links:

veja a letra de Acredito: http://www.sarabentes.com.br/page/letras-do-cd-invisivel/
Ouça a música Acredito: http://open.spotify.com/album/06bS7Hff1KJYSApN6qoWKt

Bom, pra começar, não vim de outro planeta não (ao menos não que eu saiba :D ). Mas o “outro planeta” ao qual me refiro no início da música é o mesmo planeta que abriga “vocês” pra quem canto na segunda parte da letra, ou seja, o planeta onde vivemos todos nós, nosso planeta Terra. O paralelo que faço entre um suposto outro povo e o povo da terra onde pareço estar chegando e pra quem canto é sim uma crítica à nossa sociedade, com seus desvios, ganâncias, manipulações e enganos, é um chamamento a olharmos pra nós mesmos de longe, pra então enxergarmos nossas bizarrices. Só que mais que isso, a música é uma saudação à alegria, ao positivismo, aos pequenos e inesquecíveis prazeres, às coisas tão simples quanto maravilhosas, e o paralelo é um convite à aceitação de nosso lado sombra e de nossa luz, aceitação de nossas incoerências, aceitação da dualidade do ser humano. Somos nós que fazemos a sociedade, somos nós o povo desse outro “planeta meio estranho” do início da música. E sim, se olharmos em volta temos motivos o suficiente pra desistirmos de tudo. Mas o que estamos fazendo pra melhorar nosso entorno? O que estamos fazendo de bom pra contribuir? Reclamar e se deixar contaminar pelo que não vai bem não traz soluções. Quando digo no refrão da música “Em tudo o que for melhor ou tão bonito eu acredito” não significa que eu não acredite no contrário e que eu viva no mundo cor-de-rosa, muito pelo contrário. O “acredito” aí é o foco, é o que eu prefiro olhar e me lembrar na vida. Claro, mergulhar nas nossas próprias sombras é mais que necessário, pra nosso autoconhecimento, pra nossos processos evolutivos, pra não repetirmos nossos erros e pra sermos cada vez melhores. Afinal, se não for pra isso, pra quê mesmo estamos aqui? Ao mesmo tempo, sem valorizar os bons momentos e pequenas coisas, sem espalhar boas palavras e atitudes, sem nutrir o mundo e nutrir-se de poesia, delicadeza e arte, as sombras de si mesmo e do restante da humanidade ficariam pesadas demais, insuportáveis... Esta música é um “apesar de tudo, eu escolho acreditar no lado bom da vida, no lado bom da humanidade, no lado bom de tudo, no lado bom de mim”. E, como sugere o último trecho da letra, que o melhor de mim encontre o melhor de você, que se afinem e cresçam, atraindo pra gente tudo o que sintonizar com esta luz, com o magnetismo incrível das coisas boas.

A música começa a se alegrar quando canto “Mas eu sei que aqui vocês são diferentes, por isso eu sigo em frente...”, justamente porque minha esperança é o lado bom da humanidade, o lado bom que sim, existe em cada ser humano, acreditem; um bandido não é 24 horas um bandido, assim como um bem feitor não é um ser perfeito. Na maioria dos casos o que nos desvia de nosso lado luz é justamente a falta de foco, de atenção, a falta de despertar e de crer nesse lado luz. E no refrão da música reuni várias lembranças boas de coisas tão simples, quase ridículas, que me ajudam a viver, ajudam-me a focar na alegria e no lado luz de tudo. As “descidas em ondas, risos num tobogã” foram com meu amigo Bianco Marques há poucos anos, quando por acaso fomos parar num parque de diversões ao lado do local onde estávamos cantando, e foi um momento tão rápido quanto inesquecível, devido à cumplicidade, às endorfinas liberadas, à adrenalina, às emoções compartilhadas; “o degradê que o sol traz de manhã” é a imagem que tenho do único nascer do sol que vi na praia quando eu enxergava, no Farol de São Tomé, numa viagem que fiz com minha amiga Mariana Ribeiro, e é uma memória visual que guardo com todas as minhas forças; e assim por diante... Reunir essas lembranças foi como num jogo, em que te perguntam: Quais são as lembranças sensoriais mais felizes que você tem? Ok, então agora registre essas lembranças de algum jeito que você possa sempre acessar mesmo fora da sua mente. E então foi assim que nasceu “Acredito”, pra que eu, e quem quiser, nunca nos esqueçamos de como pode ser simples, e complexo, estar feliz.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

DESCRIÇÃO – CLIPE ‘’VIVA O QUE EU VIVO’’ (Sara Bentes)




Uma mulher (Joana) de costas, dentro do  box  do banheiro, atrás de uma cortina, passa as mãos nos cabelos molhados . Em seguida puxa a toalha pendurada. Ela se prepara pra começar mais um dia.
Em outra casa, outra mulher, (Sara) se maquia com expressão de contentamento.  
Em outra cena Joana abre a porta saindo de casa.
Na cena seguinte Sara fecha a porta saindo de casa com a bengala de cego e no elevador tateia os botões do painel lendo o braile.
Na rua, Joana anda numa calçada, com roupa esportiva, cruza com um senhor com deficiência física que utiliza um skate para se locomover sentado. Ele olha para ela. Para isso tem que inclinar um pouco a cabeça. Ela não o vê. Seus olhos estão atentos à digitação no celular.
Na cena seguinte, Joana malha na academia; filme sutilmente em câmera lenta, com alguns closes em suas pernas. A câmera mostra também aparelhos com o peso que ela utiliza para os exercícios das pernas.
Outra cena: Sara com a mão apoiada sobre a bengala, canta em close. Ela está à frente de uma parede com vários quadros réplicas de Romero Brito.
Agora Sara está encostada no parapeito de um viaduto sobre uma movimentada avenida do Rio de Janeiro. A imagem se abre e em zoom se distancia e vai se distanciando até mostrar que a cena está sendo feita de uma câmera aérea.
Corta para próxima cena: Sara canta na rua com óculos bem estiloso, um lilás sutilmente transparente e à sua direita e esquerda, pessoas andam para o fundo da cena.
Joana aparece de costas, correndo em câmera lenta no meio de várias pessoas no calçadão de Copacabana. Em seguida, para bruscamente e leva as mãos sobre seu boné na cabeça mostrando que se assusta e se protege de alguma coisa.
Na cena seguinte uma manchete de jornal diz: “Mulher é atingida por bala perdida na Orla”.
A cena seguinte mostra Joana com close no rosto, de perfil e uma expressão pensativa e triste olhando estática na direção de um lugar qualquer. A câmera abre a cena e mostra que ela está em uma cadeira de rodas. Sozinha no calçadão de Copacabana. Compõem a cena a avenida e os prédios atrás.
Próxima cena: Sara está no viaduto sobre a avenida movimentada do Rio, e canta ao celular para alguém, com expressão de indignação.
Em seguida aparece atravessando na faixa de pedestres; acompanhada por uma mulher que a ajuda. Sara fala e a mulher, de cabeça um tanto baixa, esboça um sorriso enquanto a escuta. 
A cena agora é de Joana em close de perfil olhando o mar. Em seguida, em preto e branco, um flash de sua corrida na praia com roupa esportiva. 
Mais uma cena em que Sara canta com os quadros réplicas de Romero Brito atrás.  Dessa vez mais curta a tomada, muda para Sara cantando em close, a câmera foca debaixo para cima, deixando o céu azul com poucas nuvens bem à vista; atrás de Sara uma linda catedral arredondada e à esquerda duas árvores. Uma delas, coberta de flores rosa.
Outra cena com close de perfil no rosto de Joana de óculos escuros. Pensativa, ela cerra os lábios por um tempo e os  abre e novamente em preto e branco, outro flash dela brincando de bater bola na praia numa roda de amigos. Mais um close em seu rosto. Uma lágrima desce sob os óculos escuros. Mais um flash, na academia, no aparelho que trabalha pernas, ela seca o suor da testa.
Novamente Sara cantando, agora sentada, com os quadros coloridos de Romero Brito atrás de si. Batendo a bengala no chão, ela a usa para marcar o ritmo. Numa mudança de intensidade da música, crescente, ela se levanta e segue sozinha com a bengala cantando o trecho do refrão: “Viva o que eu vivo...” 
 Na cena seguinte, com a areia e prédios da orla ao fundo, a cadeirante, ainda em perfil do rosto, retira os óculos, deixa descer mais uma lágrima e em seguida, com expressão mais refeita, seca as lágrimas com uma das mãos. 
Muda de cena e Joana está tocando a cadeira numa faixa de pedestres, um gari, que está trabalhando, vem ajudá-la e ela olha para trás e conversa com ele, agradecida. Em seguida, outra travessia; duas mulheres a ajudam e elas conversam entre si. Joana aponta para onde vai e logo outra tomada lateral de cena a mostra tocando sozinha a cadeira em uma calçada. Na mesma calçada Joana aparece pelas costas, tocando a cadeira, ‘’tocando a vida’’, e a imagem fica um pouco desfocada enquanto ela dobra uma esquina e desaparece da cena. 
Volta à Sara,  que canta em close, de frente. À sua direita e esquerda pessoas passam, agora  na direção da câmera.
Sara em close do rosto, finaliza a canção com a fala ( ‘’Você vai saber!”)e interpreta, mostrando a expressão de um sorriso de lábios fechados. Com um ar de certa traquinagem, fecha a cena com uma olhadela para o lado, que pode soar provocadora. 
Um quadro pequeno, em metade da tela, mostra cena de Sara pelas costas, caminhando sozinha, com a bengala numa calçada larga e a rua, com algumas pessoas caminhando, vendedores ambulantes e prédios ao fundo. Essa imagem finaliza o clipe enquanto os créditos e agradecimentos vão subindo na outra metade da tela.

Créditos:
VIVA O QUE EU VIVO
Música, letra e voz: Sara Bentes
Arranjo: Luiz Otávio
Gravado, mixado e masterizado no Virtuose Estúdio
Roteiro, direção e atuação: Leslie Assis
Câmera e edição: Michel Monteiro 
Descritora: Vania Lee

Agradecimentos:
Kika Monnteiro
Larissa Mello
Sr. José Nunes Bezerra Filho
Patrick Gonzaga do Nascimento
Alan Frank Neves
Valney Freitas
Luanara e Vanessa
Graice
Sr. Osni Diniz
Aline Bentes
Carol Bentes
Thiago Pimentel
Samir kuraiem
Amanda Canuto
Leandro Ferreira
Rômulo Vieira
Gil Rosza
Joyce Mendes

Apoio: 
Volta Cultural
Clube Foto
Emprol RH
Mundo Cegal
Talento Incluir
Body Move Academia

terça-feira, 30 de junho de 2015

O coral de todos os momentos

Nasci num coral grande. Não, um coro de anjos celestiais não cantou por minha chegada ao mundo. Falo de um coral terreno, que é minha família paterna, com uma avó sorridente (meu avô falecera 10 dias antes, provavelmente pra fiscalizar lá de cima todos os trâmites espirituais de meu nascimento, como bom fiscal que era), onze tios (com meu pai, somando 12 irmãos) e quase trinta primos, só de primeiro grau. Em outro ponto da cidade, ao saber de meu nascimento, um dos onze tios compunha ao violão (que provavelmente já estava em seus braços) uma música com meu nome.
                
Fosse onde fosse e por qual motivo fosse, cada reunião de família virava fatalmente uma festa. Natal, aniversários, ou simplesmente vontade de cantar. Sim, um dos melhores momentos era sempre a hora da cantoria. Acompanhadas por violão, baixo, teclado, palmas, pandeirola, copos, e qualquer outra coisa que gerasse som, vozes graves, vozes médias, vozes agudas, vozes fortes e vozes tímidas; muitas vozes, e sempre com direito a segundas e terceiras vozes. Harmonia nem sempre perfeita, nem todos sempre afinados, como em toda família, mas aquelas notas, aquelas músicas, aqueles ritmos, mesmo que eu não quisesse, entrariam por todos os meus sentidos durante todo o meu crescimento. Se eu estivesse catando goiaba vermelha no quintal da vó, ou montando teatrinho com uma dezena de primos, ou experimentando umas notas no piano da tia mais nova, ou aprontando com o primo adorado e tomando chamada da vó, eu recebia toda aquela música.
                
Com meus doze anos, pela primeira vez vi aquele grande coral se esmorecer. Era hora da vó Joaninha partir. E, após a dolorosa despedida física, fomos todos pra casa dela e, fora sua difícil ausência e a cantoria, tinha a costumeira comilança, as piadas de uma família de humor incorrigível e as crianças correndo por toda parte. Um priminho pequeno, ao voltar pra casa com a família, comentou alegre com a mãe: “A festa da vó estava tão legal!” Por outro lado, o tio mais novo gerava uma poesia dedicada à mãe. E tempos depois, meu pai transformava a saudade em uma nova canção. Assim o grande coral demonstrava mais uma vez a capacidade de transformar dor e alegria em arte.
                
Não demorou muito pra que o grande coral voltasse à ativa, mesmo quando ainda doía a falta da voz mais doce. E agora eu também já era uma voz cantante no coro. Muitos primos, em geral os mais velhos, já faziam parte cantante do coro também, assim como, ao longo do tempo, outros instrumentos foram adicionados à banda, como violino, violoncelo, bateria e até representantes exóticos da música internacional, como o kazoo, o hulusi e o ukulele.
                
Da mesma forma que crescia a diversidade musical, crescia também a diversidade de sorrisos, de cores, de personalidades, pois a minha geração de primos agora tinha seus filhos, e a família crescia, e continua crescendo... E, seguindo a mesma lei da vida, os tios começaram a diminuir; de onze, agora são nove, desde quando, em 2012, o primeiro foi embora, o tio Luiz, furando a fila por idade. Aliás, nada surpreendente em se tratando dele, que era um dos piores da família de humor incorrigível. Dentre as tantas que ele aprontou, contam que certa vez ele entrou no banco todo torto e simulando uma grande dificuldade na fala só pra ser atendido na frente. Bom, nem preciso dizer que no velório dele era uma alternância de lágrimas e gargalhadas abafadas, quando alguém vinha contar alguma outra que ele tinha aprontado e que nunca chegara aos nossos ouvidos. E o grande coral, talvez mais maduro, até conseguiu cantar desta vez. Mas eu não, não consegui conciliar lágrimas e canto.
                
Na última sexta-feira, foi embora mais um tio, o tio Manoel. Lá estava de novo o grande coro, com as vozes graves e agudas, segundas e terceiras vozes automáticas (elas simplesmente vêm). E eu, talvez um pouco mais madura, até consegui cantar também. Como sempre, lágrimas, risadas ao ouvir as tantas que também aprontou o tio da vez, e uma constatação difícil: É, o grande coral original está diminuindo... E que pena que a gente só percebe o “tarde demais” normalmente  quando já é tarde demais, pra dizer a todos eles o quanto eu os amo, o quanto me importa cada um e o quanto suas qualidades afetam minha personalidade. E o grande coral, não tem escapatória, já está perpetuado no sangue, na musicalidade e nas vozes dos filhos, netos, bisnetos (bem como o humor incorrigível e a disposição pra aprontar...).
                
Depois da despedida física, e de eu ter ouvido que devo ser a última da família a morrer, pra poder cantar no funeral de todos, mais cantoria, mais risadas e causos, a certeza de que devemos logo registrar num livro as histórias pra mais de metro dessa família tão peculiar, e os planos de cada um para o próprio funeral. Como em algum lugar do oriente, em geral todos ali declaram querer festa, cantoria e risadas nesse momento tão natural, e eu também.

PS: A outra metade de minha origem, a família da mamãe, aguarde sua vez... 

Sara Bentes

Na foto abaixo, a vovó Joana com uma renca de netos, mas ainda faltando muitos que nasceram depois. Difícil uma foto com todos os tios e primos, até porque não caberia numa foto só... ;)





quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Vai dar tudo certo! (se não der tudo errado...) 4

Promoção Uma Música Só Pra Você!

Você já sabe da novidade, não sabe? Dia 25 de fevereiro será o lançamento online do meu novo CD, o “Invisível”! Mas, enquanto isso, você pode ser o felizardo que vai ganhar e ouvir uma faixa inédita do CD antes de todo mundo! Pra concorrer a este presente exclusivo é facílimo: clicar aqui http://www.sarabentes.com.br/page/vai-dar-tudo-certo-se-nao-der-tudo-errado/ e comentar o texto lá, ou qualquer um  dos textos da série deste mês de janeiro, e torcer pra ser sorteado!
Podem participar: pessoas de qualquer idade, residentes em qualquer país.
Promoção válida até 31 de janeiro. Boa sorte, boa leitura e divirta-se!

Vai dar tudo certo! (se não der tudo errado...) 4


Pois é, chegamos ao fim da nossa série. E, depois de tantas histórias e risadas, podemos concluir que o dar certo ou dar errado no fim das contas é mesmo uma questão de tempo, como nos mostra, por exemplo, a história do Einstein, que, segundo seus professores primários, tinha tudo pra dar errado... O que nos prova também que, para fazer o errado dar certo, o X da questão é o famoso jogo de cintura, que, aliado à fé, pode ir ainda mais longe. Quantas vezes, ao saborear uma das receitas deliciosas da minha mãe, ouvi dela que, no meio do preparo, ela se dera conta de que o ingrediente principal havia acabado e improvisara com um outro, que, aparentemente, não tinha nada a ver, e, resultado: a receita ficara melhor ainda! Finalizando nossas reflexões, o mais importante mesmo nesse tema são as historias pra contar. Por tal motivo é que deixo mais duas pra vocês:

Terremoto no cenário 

Dizem que o melhor da festa é o preparo- dizem que o melhor da viagem é o caminho- e eu diria que o melhor do espetáculo pode estar nos minutinhos que o precedem, mas o público não vê. E que bom que não vê... Quem compareceu à estreia do nosso espetáculo circense Belonging em São Paulo não viu o que houve antes da primeira cena, mas percebeu que algo estranho aconteceu, pois as cortinas subiram até a metade e ali ficaram, meio que se balançando, enquanto uma movimentação estranha se iniciou no palco, atores, diretores e produção olhando pra cima, preocupados com alguma coisa. Só que a “alguma coisa” era eu, que iniciava o espetáculo cantando sentada num lustre de metal pendurado a 12m de altura. Antes de todo espetáculo, eu sempre ficava lá em cima, imóvel e silenciosa, pra nenhum som vasar naquele já nosso conhecido microfoninho headset (o mesmo que me acompanhava na cena do enrosco no texto 1 aqui da nossa série), aguardando as cortinas se abrirem e a cena começar. Naquele dia, tudo seguia igual, até o momento em que, segundos após o início do som das cortinas subindo, fui subitamente empurrada por algo que vinha justamente da direção das cortinas e fiquei balançando e rodando pra lá e pra cá, como um lustre que toma uma bolada; com a pequena diferença de altura entre o lustre de casa e o lustre do circo... Tudo e nada me passou pela cabeça ali, a 12m do chão, foi tudo muito rápido pra dar tempo de raciocinar alguma coisa. A única coisa que fiz, instintivamente, foi segurar com mais força na corda do lustre, além de quase me borrar de medo, claro. Eu não podia ver e não tinha ideia do que estava acontecendo e muito menos do que podia vir a acontecer com aquilo se balançando daquele jeito. Nessas horas é que se torna mais aventureiro ainda não enxergar... Passado um pouco o susto e amenizada a sacodida, conseguiram destravar as cortinas e as desceram novamente. Então, baixaram o lustre, eu desci dele pra me acalmar um pouco e me explicaram que o “terremoto localizado” se deu por conta de um desajuste na temperatura do ar condicionado, que ficara muito diferente na plateia e no palco, e quando as cortinas começaram a subir, foram subitamente empurradas pelo ar mais quente, o da plateia, em direção ao centro do palco. Com isso, o lustre, que estava logo atrás das cortinas, foi empurrado por elas com tanta força. Caramba, eu nunca imaginei que isso pudesse acontecer... Muito menos que pudesse acontecer comigo pendurada a 12m do chão... Bom, mas circo é surpresa, mágica e emoção...

Depois que respirei um pouco, subi no lustre de volta, subiram o lustre, abriram as cortinas e o espetáculo começou, cheio de emoção, mas nenhuma mais fora do previsto... Ufa, por pouco o elenco daquele dia não atua sem uma atriz. O que seria menos pior do que só sobrar no palco uma atriz atuando sem o restante todo do elenco, como quase aconteceu há uns 3 anos na cia. Mix Menestreis...

O exterminador de elenco

Eu já havia feito tantas vezes aquela cena, que já podia fazê-la de olhos fechados...  Bom, mas sempre com a mesma pessoa, o meu amigo Guizaum, que é cadeirante e havíamos desenvolvido por meses nossa interação na cena. Um belo dia ele não pôde ir e teve de ser substituído. Meu parceiro de cena então era um rapaz sem deficiência e que não tinha experiência alguma no tema, muito menos experiência em interagir com pessoas com deficiência em cena... Ele já começou quente, no primeiro abraço que me deu em cena, veio com tanta empolgação que derrubou de minha mão minha coadjuvante Izadora (minha bengala). Gentilmente ele a pegou e seguimos em frente. A ideia era brincar e correr entre os monumentos, representados pelo restante do elenco espalhado em estátuas pelo palco. Normalmente, com meu parceiro cadeirante, eu apenas segurava atrás da cadeira e corria tranquila, seguindo a trajetória dele. Mas meu novo parceiro achou que era só me puxar, e com toda a velocidade... Ele corria e me puxava pela mão por entre o elenco e, de repente, “BUM”, uma colisão contra um “monumento”. Pelos cabelos que toquei e pelas risadas que ouvi, identifiquei que o “monumento” era minha amiga Aninha, que faz aquele estilo “sou pé frio, tudo acontece comigo, tinha que ser eu etc”. Eu ri, pedi desculpas e senti que ela bambeava feito joão bobo, pra frente e pra trás. Mas definitivamente o problema ali não era a pé frio da Aninha... Depois de me arremessar contra ela, o parceiro continuou a me conduzir pela cena, com um pouquinho mais de cuidado, só um pouquinho, até o momento em que me botou em suas costas, de cavalinho, e começou a girar freneticamente no centro do palco. Eu ria, me divertia, mas, com a velocidade, mal podia controlar a Izadora, que, movida pela força centrífuga, se erguia do chão e se transformava em uma mortífera hélice de helicóptero em minha mão. Os pobres dos “monumentos” se inclinavam pra trás e davam discretos passinhos pra mais longe da Izadora. Ou seja, meu parceiro tentou exterminar a mim e ao elenco inteiro, mas, graças aos deuses do teatro, o máximo que ele conseguiu foi fazer os monumentos tomarem vida e se moverem e transformar uma emocionante cena romântica numa comédia pastelão. E pra vocês verem a cena original que fazíamos, sem pastelão, ela tá aqui: http://www.youtube.com/watch?v=zY6w49AKvLs

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quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Vai dar tudo certo! (Se não der tudo errado...) 3

Promoção Uma Música Só Pra Você!

Você já sabe da novidade, não sabe? Dia 25 de fevereiro será o lançamento online do meu novo CD, o “Invisível”! Mas, enquanto isso, você pode ser o felizardo que vai ganhar e ouvir uma faixa inédita do CD antes de todo mundo! Pra concorrer a este presente exclusivo é facílimo: clicar aqui http://www.sarabentes.com.br/page/vai-dar-tudo-certo-se-nao-der-tudo-errado/ e comentar o texto lá, ou qualquer um  dos textos da série deste mês de janeiro, e torcer pra ser sorteado!
Podem participar: pessoas de qualquer idade, residentes em qualquer país.
Promoção válida até 31 de janeiro. Boa sorte, boa leitura e divirta-se!



Assim como a arte, a vida e as pessoas são inexatas e surpreendentes. E que bom que é assim! Por isso mesmo é que muitas vezes, com nossas expectativas e previsões erradas, somos positivamente surpreendidos. Foi assim, com uma surpresa dessas, que fui selecionada pra participar do projeto Percepções, exibido no programa Fantástico – Rede globo em 2005/2006. O instituto que promoveu o projeto pediu a uma consultora que indicasse uma lista de candidatos com o perfil aventureiro, independente e arrojado que a vaga pedia. A consultora, uma amiga antiga minha e da minha família, apresentou uma lista e, por último, talvez só pra preencher espaço, já que ela achava que eu não tinha nada a ver com o perfil, estava meu nome. Bom, depois de alguns meses, após entrevistas com vários candidatos, lá estava eu, selecionada pelo instituto e embarcando no projeto Percepções, um divisor de águas na minha vida, viagem intensa de 3 meses por 9 países da América do Sul.

Veja um videoclipe do Percepções aqui: https://www.youtube.com/watch?v=j49wexpHfWk
Porém não é sempre que essa mesma inexatidão humana nos traz positivas surpresas... Quando o assunto é uma gravação de um telejornal por exemplo, é bom que seja tudo o mais exato possível. Mas não foi bem assim comigo numa gravação externa do telelibras, telejornal online da ong Vez da Voz, há alguns anos...

Sara Bentes e o intérprete... Qual é mesmo o intérprete?

Pra quem não conhece, o Telelibras é um modelo totalmente acessível de telejornal, onde apresentador e intérprete de libras – língua brasileira de sinais, dividem o mesmo espaço e figuram no mesmo plano. Pra isso, o intérprete está sempre ao lado do apresentador e traduz simultaneamente. A mesma coisa ocorre nas matérias externas, e, em eventos longos e movimentados, o Telelibras contava com o trabalho de dois ou mais intérpretes de Libras, que se alternavam ao lado do repórter nas gravações. Ao fim de toda matéria, o repórter se apresentava e apresentava o intérprete ao lado. A repórter da vez era eu, e o intérprete... Hum, o intérprete... depois de umas dez entrevistas, cada uma traduzida por um intérprete diferente, quem era mesmo o intérprete que me acompanhava? O intérprete de Libras em geral se mantém silencioso enquanto sinaliza, então eu não podia me orientar por sua voz. Puxa, se ao menos ele estivesse do meu lado, eu poderia tentar identificá-lo pelo cheiro. Mas não, ele estava à direita do entrevistado, que estava à minha direita. Eu me concentrei em tudo, no foco para a câmera, na altura da pessoa para oferecer a ela o microfone sem golpeá-la, nas perguntas e respostas, tudo fluindo perfeitamente bem numa entrevista riquíssima, até que: “Sara Bentes e a intérprete Rafaela Sessenta para o Telelibras!” Ouvi um sonoro “Ahhhhh” de toda a equipe e a risada do Fabiano Campos, o intérprete da vez, e não acreditei no que acabara de fazer. A Rafaela Sessenta já tinha ido até embora. E aí, tome risadas, e fôlego pra gravar tudo de novo...
Bom, ao menos não era ao vivo; ufa! Porque em vexames em cena ao vivo já estou ficando diplomada. E este que estou para contar a vocês é, sem dúvida, o pior vexame em cena da minha história até aqui...

“Cantora Desenvolve Estranha Modalidade de Canto”

Uma matéria de jornal relatando o triste fato começaria bem assim. Mas, graças a deus, nenhum jornal sensacionalista reportou o ocorrido naquela noite de jantar solene na reunião de um dos Rotary Clubes de Volta Redonda. Os trajes eram ternos e longos, o ambiente era elegante e de luzes indiretas, o cardápio trazia algo ao molho madeira, os senhores, senhoras e suas famílias eram educados e gentis, tudo apontava para um impecável acontecimento rotariano. Ah, claro, um detalhe importante (que na verdade é o pivô da confusão), o jantar impecável tinha música ao vivo, voz e violão; e, lamentavelmente, eu era a cantora em questão, e o violonista era meu querido amigo Adriano Pinheiro. Bom, pra tanta elegância, preparamos um repertório fino, começando com uma bossa nova do Caetano Veloso. Nos posicionamos diante de todos, ajeitamos violão e microfone e todos fizeram o mais absoluto silêncio em suas mesas para nos prestigiar. O problema foi que um amigo antigo da família, membro do clube, fez questão de me apresentar lendo um breve release da minha trajetória artística. Ele pegou o microfone e, simpaticamente, começou a ler. Todos ouviam atentos, enquanto eu e Adriano exibíamos um elegante sorriso de comercial de creme dental, ansiosos pra começarmos logo a cantar; e tudo ia muito bem, até que o amigo se deparou com a frase: “Sara Bentes canta com a banda sinfônica da CSN” Na verdade ele nem chegou no “sinfônica”, porque já na “banda” ele, displicentemente, realizou uma pequena troca de vogais, substituindo o primeiro “A” por um sonoro “U”. Pois é, isso mesmo, ele declarou em alto e bom som essa frase aí que vocês conseguiram imaginar... É incrível como toda aquela elegância, toda aquela nobreza, toda aquela fineza, tudo se transformou tão repentinamente numa gargalhada coletiva de perder o fôlego... Eu, que já não gosto nadinha de rir, não vi outra saída senão me acabar de rir também, seguida pelo Adriano, que também adora um mal feito. O apresentador até tentava se recompor e se desculpar, mas nem era mais ouvido, e só foi conseguir terminar de ler meu release após alguns minutos, quando todos já se acalmavam um pouco, mas só um pouco, a crise de riso ainda estava à espreita no salão. Quando ele, ainda rindo também, terminou sua tarefa e nos deu a vez, eu me esforçava pra voltar a me concentrar, mas, sabendo que seria como uma missão impossível, eu disse ao Adriano, que também não parava de rir: “Pro espaço a bossa nova do Caetano e manda logo um forró aí”.

E foi assim que uma noite de gala se transformou no pior vexame da minha vida... Se de toda experiência podemos extrair um aprendizado, nessa aí aprendi que, se você for cantar ao vivo e o apresentador for ler seu release, nunca escreva nele que você canta com qualquer banda, nem que seja a banda oficial do presidente da ONU, mas invente outro nome, escreva “grupo instrumental”, ou o arcaico termo “conjunto”, ou omita o fato, sei lá, qualquer coisa, mas “banda” jamais!

No próximo episódio: um “terremoto” no cenário e eu pendurada a 12 metros do chão; e o dia em que quase liquidei todo o elenco do teatro; até a próxima semana!

Leia o episódio 1 aqui: http://www.sarabentes.com.br/page/vai-dar-tudo-certo-se-nao-der-tudo-errado/
Leia o episódio 2 aqui: http://www.sarabentes.com.br/page/vai-dar-tudo-certo-se-nao-der-tudo-errado-2/

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quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Vai dar tudo certo! (Se não der tudo errado...) 2

Promoção Uma Música Só Pra Você!

Você já sabe da novidade, não sabe? Dia 25 de fevereiro será o lançamento online do meu novo CD, o “Invisível”! Mas, enquanto isso, você pode ser o felizardo que vai ganhar e ouvir uma faixa inédita do CD antes de todo mundo! Pra concorrer a este presente exclusivo é facílimo: clicar aqui http://www.sarabentes.com.br/page/vai-dar-tudo-certo-se-nao-der-tudo-errado/ e comentar o texto lá, ou qualquer um  dos textos da série deste mês de janeiro, e torcer pra ser sorteado!
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Promoção válida até 31 de janeiro. Boa sorte, boa leitura e divirta-se!

Vai dar tudo certo! (Se não der tudo errado...) 2



Há males que vêm pra bem. Já dizia meu pai nos meus 10 anos de idade, quando fui forçada a trocar de escola porque a direção da escola onde eu estudava desde os 6 decidiu que ali não era mais meu lugar, que eu atrapalhava o restante da turma etc. Enfim, coisas que me deixaram muito triste na época e lamentei deixar pra trás meus amiguinhos. Mas foi na nova escola, 2 anos depois de meu ingresso lá, que tive meu primeiro contato com técnicas de canto e encontrei espaço e incentivo pra começar a cantar em público, e dali não parei mais. Bom, ali eu já entendi o ditado que meu pai tanto me repetiu. E, ao longo da minha trajetória, fui entendendo que na arte, inexata e subjetiva, o ditado também se aplica e que, frequentemente, um “erro” vem a se tornar a cereja do bolo, o toque que faltava, um gol de placa!

Tá errado mas tá mais bonito! 

Exemplo disso foi o que aconteceu na faixa número 1 do nosso CD infantil, o “Faz Sempre Sol”. Arranjo pronto, todos os instrumentos gravados. Só que, pra ganhar tempo, o violino e a flauta não gravaram todas as repetições do refrão; afinal a tecnologia está aí pra nos ajudar e, com o bom e velho ctrl C ctrl V, a gente ganha um tempão de estúdio. Quando o Júnior, nosso operador de estúdio, foi colar o trechinho de violino que cantava junto com a voz, sem querer ele colou num outro ponto, entre uma frase e outra de voz, e ficou como um contracanto de violino. “Opa, desculpa, tá no lugar errado” ele disse, já se apressando em descolar o violino dali. Eu e todos os músicos no estúdio, encantados com o efeito inesperado do violino no lugar “errado”, protestamos: “Não, não, não! Deixa aí. Tá errado mas tá mais bonito!” Ouvimos de novo e, rindo muito, todos concordamos que assim estava melhor. O Fred Portilho, nosso violinista, gravou mais uma pequena frase de violino só pra criar uma conexão entre o novo arranjo e o antigo e pronto! Agradecemos ao Júnior pelo “erro” e no segundo refrão da  música, “O Maior Brinquedo do Mundo”, figura pra sempre assim, o violino no lugar errado porém muito mais bonito.
A música tá no Youtube, num clipe que foi super divertido de fazer: http://www.youtube.com/watch?v=CeR4-IrI0Q8
E tá no Soundcloud, onde dá pra ouvir melhor os detalhes: http://soundcloud.com/sarabentesoficial/o-maior-brinquedo-do-mundo

Por outro lado, há quem defenda a ideia de que a música não passa de uma grande matemática, e muito exata. Apesar de não gostar deste conceito, concordo que muitas vezes um pequeno erro de cálculo na música e uma notinha inesperada podem desandar tudo e até derrubar um cantor da canção. Foi o que aconteceu comigo e meu amigo violonista Eneas Resende num show ao vivo em Juiz de Fora há alguns anos...

Quem Disse Que O Show Não Pode Parar?

A música era cabeluda sim, de harmonia traiçoeira e melodia complexa, mas uma música linda, com grande extensão vocal e que permitia a demonstração de interpretação e técnica mais rebuscada, tanto para o cantor quanto para o instrumentista. A música se chama “Sou Sua Sabiá”, de Caetano Veloso; a cantora, no caso, era eu; e o instrumentista... Ah, o instrumentista... era meu talentosíssimo amigo Eneas Resende, que esbanja criatividade e técnica no violão, muito mais técnica do que eu na voz. Estávamos mais que acostumados a tocar aquela canção, naquele dia porém talvez ele estivesse mais “criativo” que nos outros, e resolveu inventar uma firula justamente num acorde crucial pra uma modulação de tonalidade no meio da música. Bom, a partir daí já dá pra imaginar o que aconteceu, né? O trem descarrilou e fomos um pra porto alegre e o outro pra salvador. Apesar da firula, ele modulou pro tom certo, pois ali no violão sim a matemática é mais exata e ele sabia exatamente em que casa do braço do violão devia montar o acorde; já na voz e na percepção musical a coisa não é tão exata assim, e meu ouvido dependia da dica do acorde crucial dele pra modular o tom, acorde onde ele fez a firula e me confundi, fiquei sem chão, e modulei pra um tom que definitivamente não era nenhum dos 12 que conhecemos aqui no ocidente... E aí passamos os 3 acordes seguintes tentando encontrar um ao outro, eu tentando me acalmar pra perceber o tom do violão e ele tentando perseguir o tom da minha voz; um verdadeiro cataclisma musical. Até que ele, sabiamente, decidiu abreviar o sofrimento nosso e o do público: parou de tocar e me disse a clara voz, sem qualquer constrangimento, como quem chama a amiguinha pra brincar: “Sarinha, vamos começar de novo?” Meu deus, o que dizer ao público nessas horas? Como reconquistar o apoio da plateia depois de parar uma música no meio? Essas interrogações e mais algumas se embaralhavam na minha cabeça naqueles segundos que se pareceram uma eternidade. Enfim, inspirada pela cara de pau do Eneas e iluminada talvez por santa Cecília, falei, no mesmo tom descarado do meu amigo: “Desculpa, gente, mas é que o Caetano Veloso merece que a gente comece de novo e faça melhor.” A plateia nos aplaudiu generosa e recomeçamos do zero, agora sem grandes firulas ou pequenos sufocos.

Assim seguimos, sobrevivendo aos desastres musicais e aprendendo com as experiências e com nossos companheiros. Aprendi e aprendo muito com meu amigo Eneas e aprendi também que somente passando por desafios assim é que desenvolvemos a serenidade necessária pra estar em cena e encarar os próximos desafios, em geral, maiores que os que já encaramos até aqui...

Na próxima semana: quando o cansaço e as repetições te fazem vacilar na concentração e estragar uma cena inteira, quando o apresentador distraído te proporciona o pior vexame de sua vida... Até o próximo episódio!

Leia o episódio 1 aqui: http://sarabentes.blogspot.com.br/2015/01/vai-dar-tudo-certo-se-nao-der-tudo.html

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